O consumo de nutrientes e o correto aporte de energia são vitais para a manutenção da saúde e performance de um atleta. (1) Quando se fala em correto aporte de energia, os hidratos de carbono ou glícidos são os grandes fornecedores de energia para a maior parte dos eventos competitivos. (2, 3) Por esta razão, é importante refletir sobre a importância do controlo glicémico em nutrição desportiva. O exercício físico: – diminui a concentração de glicose durante e após o exercício; – pois acelera a sua utilização pelo fígado e músculo; – e aumenta a sensibilidade muscular e hepática à ação da insulina; (4) sendo este mecanismo de depleção de glícidos durante o exercício físico, que permite a sua reposição hepática e muscular realizado pela insulina. Efetivamente, as células beta pancreáticas são as responsáveis pela produção de insulina e, consequentemente pela regulação da glicemia sanguínea. Todavia, estas células contém baixos níveis de enzimas antioxidantes, o que as torna mais sensíveis ao dano oxidativo.(5) Desta forma, é necessário a manutenção de baixos níveis de stress oxidativo em atletas, trabalhando para a melhoria da regulação glicémica, fornecimento e reposição de hidratos de carbono eficazes, necessários para o exercício físico. Além disso, o prática de exercício físico de alta intensidade é capaz de instalar um ambiente inflamatório muscular, devido à elevada produção de espécies reativas de oxigénio, podendo favorecer o Delayed Onset Muscle Soreness, que se traduz em dores, rigidez muscular e maior sensibilidade, podendo afetar e reduzir os níveis de performance física, perda de massa muscular, fadiga e lesões. (6) Estas consequências devem ser evitadas ao máximo, especialmente em atletas, que dependem exclusivamente do seu estado de saúde físico para o êxito desportivo. Desta forma, como podemos mitigar o dano oxidativo resultante do exercício intenso e, ao mesmo tempo manter um bom controlo glicémico, que é essencial para o fornecimento de energia adequado? Atletas necessitam de energia imediata para o exercício, proveniente da ingestão de macronutrientes como a glicose. Para metabolizar a glicose ingerida através da dieta é necessário um processo chamado respiração celular, onde a glicose é degradada e a sua energia é usada na formação de ATP (adenosina trifosfato). Parte deste processo é decorrido dentro da mitocôndria, onde a ação da Coenzima Q10 é crucial.
A Coenzima Q10 é sintetizada no organismo humano, podendo existir na forma oxidada, chamada ubiquinona, ou na forma reduzida, denominada ubiquinol. A coenzima Q10 apresenta inúmeras funções. Nomeadamente, na forma de ubiquinol é um potente antioxidante com a função de proteger membranas celulares mais sensíveis no nosso organismo contra o dano oxidativo. (7, 8) Desempenha ainda outra importante função, relativamente à produção de energia, através da respiração celular realizada na mitocôndria, onde utiliza a energia proveniente dos nutrientes para a produção de ATP (molécula que armazena energia). Órgãos como o coração e o músculo esquelético requerem níveis de energia consistente e robusta, que depende do fornecimento suficiente de CoQ10. Poucos estudos investigaram o estado de CoQ10 em atletas. Porém, alguns estudos mostram que atletas apresentam níveis plasmáticos e musculares baixos durante períodos de exercício mais intensos, ou até mesmo quando comparados com indivíduos normais saudáveis. (9, 10) Desta forma, existe alguma evidência que atletas necessitam de aportes superiores de CoQ10, devido ao elevado requisito metabólico que são submetidos. Outras razões que podem diminuir os níveis de CoQ10 em atletas podem estar relacionados com a adesão a dietas vegetarianas; situações de biossíntese comprometida devido a deficiências nutricionais, como selénio, vitamina B6, magnésio, etc.; situações de consumo elevado de vitamina E, que inibe a captação de CoQ10 proveniente da dieta e reduz os níveis plasmáticos de CoQ10; terapia farmacológica com estatinas limita a biossíntese e depleta os níveis plasmáticos de CoQ10. (11) Uma das formas de corrigir estes défices (sempre com a confirmação através da realização de análises bioquímicas), pode ser recorrendo à suplementação. Todavia, o valor exato da dose vantajosa e eficaz não tem consenso entre a comunidade científica, sendo desta forma imperativo frisar a individualidade metabólica e genética de cada atleta, sendo ideal uma suplementação individualizada, sempre com o objetivo de usufruir das caraterísticas da CoQ10 para melhoria da performance, descrita já em alguns estudos. Quanto à sua potencialidade ergogénica, Dietmar e colaboradores (11) realizaram um estudo, que tinha como objetivo investigar em que extensão o treino físico em atletas de elite podia ser positivamente influenciado pela toma adicional de 300mg de Ubiquinol de forma crónica (6 semanas), comparativamente a um placebo. Efetivamente, a suplementação teve um impacto significativo no aumento da performance física, medida através da potência máxima, mas apenas para resultados absolutos. Os mesmos resultados expressos em percentagem não demonstraram significância estatística. Apesar do estudo relatar apenas uma pequena vantagem numérica, entre o grupo experimental e o grupo de controlo é importante destacar, que em atletas de elite todos os pormenores são vitais. Estes atletas detém níveis de competência tão elevados, que é difícil demonstrar qualquer benefício ergogénico adicional fruto da suplementação, que promova melhoria no desempenho físico. É de importância acrescentar que a suplementação com CoQ10 pode particularmente beneficiar ainda mais atletas sénior, pois o processo de envelhecimento reduz o número de mitocôndrias no organismo, assim como o nível de CoQ10 nos tecidos também diminui. Assim sendo, aumentar o conteúdo de CoQ10 nas mitocôndrias já existentes pode ajudar a compensar os défices que advém deste processo inevitável. Noutro trabalho, Cooke e seus colaboradores (12) tentaram determinar se a suplementação com CoQ10 sublingual, de forma aguda (1 dose) ou crónica (durante 14 dias) melhorava a performance ambos em indivíduos treinados e não treinados. Ambas as formas de suplementação aumentaram os níveis plasmáticos e musculares de CoQ10. Mas na verdade, nenhuma das formas de suplementação aguda e crónica revelaram melhorias no índice de endurance muscular e capacidade anaeróbia, porém, constatou-se uma forte tendência no aumento do tempo de exercício até à exaustão, isto é, houve maior tolerância à carga de trabalho, podendo ser um indicador da fosforilação oxidativa aprimorada. Com efeito, não se sabe exatamente o mecanismo de atuação da CoQ10, podendo atribuir-se à combinação de uma fosforilação oxidativa mais eficiente na mitocôndria, conseguindo manter este processo mais tempo, produzir mais ATP e por consequência prolongar o exercício físico e/ou ao efeito protetor contra o dano oxidativo, uma vez que a CoQ10 é uma potente molécula antioxidante, que suporta a regeneração de outros antioxidantes, influencia a estabilidade, fluidez e permeabilidade das membranas. Em suma, a importância da CoQ10 nos vários processos metabólicos é inegável, assim como o seu potencial ergogénico em atletas de elite se demonstra promissor na melhoria da performance. Efetivamente, é fundamental sublinhar a importância da individualidade e singularidade de cada atleta, pois cada indivíduo é um sistema genético, biológico e metabólico único, fruto de uma multitude de fatores. Por essa razão, é aconselhável um conhecimento e monitorização específica, sendo mais fácil a compreensão e planeamento das necessidades e execução dos objetivos, tendo sempre em vista a otimização das sessões de treino e melhoria da performance nos eventos competitivos.
1. Paquot N. [Sports nutrition]. Rev Med Liege. 2001; 56(4):200-3.
2. Jensen J, Ruzzin J, Jebens E, Brennesvik EO, Knardahl S. Improved insulin-stimulated glucose uptake and glycogen synthase activation in rat skeletal muscles after adrenaline infusion: role of glycogen content and PKB phosphorylation. Acta Physiol Scand. 2005; 184(2):121-30.
3. Jensen J, Jebens E, Brennesvik EO, Ruzzin J, Soos MA, Engebretsen EM, et al. Muscle glycogen inharmoniously regulates glycogen synthase activity, glucose uptake, and proximal insulin signaling. Am J Physiol Endocrinol Metab. 2006; 290(1):E154-e62.
4. Yen CH, Chu YJ, Lee BJ, Lin YC, Lin PT. Effect of liquid ubiquinol supplementation on glucose, lipids and antioxidant capacity in type 2 diabetes patients: a double-blind, randomised, placebo-controlled trial. Br J Nutr. 2018; 120(1):57-63.
5. Evans JL. Antioxidants: do they have a role in the treatment of insulin resistance? Indian J Med Res. 2007; 125(3):355-72.
6. Lewis PB, Ruby D, Bush-Joseph CA. Muscle soreness and delayed-onset muscle soreness. Clin Sports Med. 2012; 31(2):255-62.
7. Ikematsu H, Nakamura K, Harashima S, Fujii K, Fukutomi N. Safety assessment of coenzyme Q10 (Kaneka Q10) in healthy subjects: a double-blind, randomized, placebo-controlled trial. Regul Toxicol Pharmacol. 2006; 44(3):212-8.
8. Hosoe K, Kitano M, Kishida H, Kubo H, Fujii K, Kitahara M. Study on safety and bioavailability of ubiquinol (Kaneka QH) after single and 4-week multiple oral administration to healthy volunteers. Regul Toxicol Pharmacol. 2007; 47(1):19-28.
9. Littarru GP, Battino M, Tomasetti M, Mordente A, Santini S, Oradei A, et al. Metabolic implications of coenzyme Q10 in red blood cells and plasma lipoproteins. Mol Aspects Med. 1994; 15 Suppl:s67-72.
10. Ho CC, Tseng CY, Chen HW, Chiu YW, Tsai MC, Chang PS, et al. Coenzyme Q10 status, glucose parameters, and antioxidative capacity in college athletes. J Int Soc Sports Nutr. 2020; 17(1):5.
11. Alf D, Schmidt ME, Siebrecht SC. Ubiquinol supplementation enhances peak power production in trained athletes: a double-blind, placebo controlled study. J Int Soc Sports Nutr. 2013; 10:24.
12. Cooke M, Iosia M, Buford T, Shelmadine B, Hudson G, Kerksick C, et al. Effects of acute and 14-day coenzyme Q10 supplementation on exercise performance in both trained and untrained individuals. J Int Soc Sports Nutr. 2008; 5:8.